quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Mais tempo para algumas disciplinas e menos horas nas salas de aula

História e Geografia do 7.º e 9.º anos, Ciências Naturais e Físico-Química do 7.º ao 9.º anos terão mais uma aula por semana. A disciplina de Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) sairá do 9.º ano e passará para o 5.º e 6.º anos. O Inglês será obrigatório a partir do 2.º ciclo. Formação Cívica e Estudo Acompanhado desaparecerão do currículo, surgirão cinco horas facultativas de Apoio ao Estudo no 2.º ciclo, e a carga horária da maior parte dos anos será reduzida. A maior redução será sentida no 12.º ano que de 13 a 14 horas por semana passará a ter 10. Estas são as principais propostas do Ministério da Educação para a reforma curricular que poderá começar a ser aplicada já no próximo ano letivo. O documento está em discussão pública até ao final de janeiro.

O ministro Nuno Crato anunciou as alterações esta segunda-feira, durante uma conferência de imprensa, em que sublinhou que a revisão curricular não foi feita "a olhar para o orçamento", mas que surge em nome de "um melhor ensino". A ideia é, explicou, "centrar mais o currículo nos conhecimentos fundamentais e reforçar a aprendizagem nas disciplinas essenciais". Mas a reforma curricular não agrada a todos.

A Associação de Professores de História (APH) vê assim cumprida uma antiga reivindicação, de mais horas para a disciplina, mas teme que haja uma "disputa" entre História e Geografia, uma vez que as escolas podem optar por dar mais tempo a uma ou a outra. "Obriga a uma certa disputa, que é sempre desagradável", referiu Raquel Henriques, presidente da APH, à Lusa. "Em algumas escolas ganhamos 45 minutos, noutras fica igual", acrescentou.

A Associação de Professores de Geografia (APG) também ficou satisfeita com a proposta da tutela e por a fusão entre História e Geografia ter sido completamente posta de parte. Em comunicado, a APG sublinha que a reforma "vai permitir que Geografia tenha três tempos letivos no 7.º e/ou no 8.º ano e três tempos letivos no 9.º ano". A distribuição compete às escolas. A APG considera a medida fundamental porque permitirá "que deixem de existir professores a lecionar 11 turmas e com mais de 300 alunos". No entanto, há uma preocupação antiga que mantém em relação à Geografia e Geografia de Portugal, sobretudo no 2.º ciclo, já que "nunca foi reconhecida habilitação própria aos professores de Geografia para lecionar a disciplina de História e Geografia de Portugal".

A Associação dos Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo (AEEP), por seu turno, defende que se pode ir mais longe na autonomia dada às escolas na gestão da carga horária. "É fundamental que as escolas tenham projetos educativos diferentes para as famílias poderem escolher", adiantou, à Lusa, João Alvarenga, presidente da AEEP. No geral, a AEEP está satisfeita com a reforma curricular, mas, ainda assim, sublinha a importância de um currículo mínimo nacional definido pelo Ministério da Educação que cada escola pública ou privada preencheria conforme o seu projeto educativo. A AEEP irá, portanto, apresentar propostas para uma maior autonomia na gestão dos currículos.

Mais professores sem escola
A Federação Nacional dos Professores (FENPROF) fez as contas e teme que a reforma curricular apresentada pela tutela signifique menos 11 mil professores com trabalho no próximo ano letivo. "Da eliminação de desdobramentos, bem como de opções anuais no secundário, haverá igualmente um impacto negativo nos docentes das disciplinas envolvidas. Por fim, da eliminação de Estudo Acompanhado e da Formação Cívica resultará também uma redução muito significativa de horários que, neste caso, atingirão a generalidade dos docentes", sustenta em comunicado.

A FENPROF não fala de uma verdadeira reforma, mas sim de "alguns ajustamentos ao que se encontra em vigor". E considera que a reorganização anunciada não dá a devida atenção às áreas de expressões, de formação cívica e das tecnologias no Ensino Básico. No secundário, a FENPROF critica o empobrecimento do currículo e diz que faltam explicações da tutela sobre os critérios utilizados para reduzir horas e suprimir uma das opções anuais. No 2.º ciclo há também dúvidas. "O caráter facultativo do Apoio ao Estudo no 2.º ciclo carece de explicação sobre em que condições poderá ser levada a efeito a sua promoção: só quando as escolas reúnam as condições para o fazer, sem necessitarem de reforçar o seu corpo docente, ou, caso se torne indispensável, o MEC garante a colocação dos docentes necessários?", questiona.

A estrutura vai pedir ao ministério o estudo de impacto financeiro do projeto e respetiva fundamentação e diz que é necessário mais tempo para analisar as propostas. Na próxima semana, segunda e terça-feira, a FENPROF, que exigiu que o Governo recue na intenção de alterar a vinculação profissional da classe no âmbito da negociação da revisão do Estatuto da Carreira Docente, reúne o secretariado nacional.

A Federação Nacional da Educação (FNE) lamenta que as organizações sindicais não tenham sido consultadas neste processo de revisão curricular. "É nosso entendimento que, entre outras entidades, aquelas que são representativas dos docentes, são essenciais para o sucesso de qualquer medida que se queira tomar a este nível, e não deveriam ter sido marginalizadas neste contexto", refere, em comunicado. A FNE continua preocupada com o facto das questões orçamentais se sobreporem às questões pedagógicas e promete dar os seus contributos durante o período de consulta pública.

De qualquer forma, a estrutura defende uma revisão curricular do ensino secundário no que diz respeito às disciplinas, às ofertas de percursos formativos e aos conteúdos programáticos. "A qualidade do sistema educativo não se compadece com novas revisões curriculares que obedeçam à lógica que lhes têm presidido nos últimos anos: meras mudanças avulsas, sem coerência, sem justificação e obedecendo a preocupações conjunturais", aponta.

Partidos pedem alargamento de prazo
O Sindicato dos Professores da Madeira (SPM) veio entretanto a público manifestar o seu descontentamento com o programa regional e lamentar que não haja uma alteração de rumo. "A comunidade educativa merecia e esperava mais do que uma lista de intenções gerais e promessas", disse Marília Azevedo, presidente do SPM, adiantando que esperava mais do novo secretário que tutela a área da Educação na Madeira. A dirigente sindical lembra que os dados provisórios dos Censos de 2011 indicam que o número de madeirenses sem instrução aumentou na última década. "A insularidade e a ditadura determinaram um grande atraso em termos educativos neste arquipélago", acusou numa conferência de imprensa.

O PCP já pediu que o prazo da discussão pública da reorganização curricular seja alargado até ao final de fevereiro e solicitou uma audição pública no Parlamento sobre o assunto. "O Governo quer fazer passar isto por entre as gotas da chuva", acusou o deputado Manuel Tiago, afirmando que "este é o momento de chamar todos e não de excluir alguns". Segundo o político, mais um mês de discussão "permitirá uma participação mais efetiva e mais ampla". Durante o mês de janeiro, e por todo o país, os deputados do PCP promovem "audições descentralizadas" com a comunidade escolar.

O BE também defende o alargamento do prazo do processo de consulta pública e, nesse sentido, vai apresentar um projeto de resolução ao Governo para que haja um debate alargado com a sociedade portuguesa. O partido está bastante apreensivo com as propostas da tutela. "Esta reforma curricular é exatamente o que parece, aquilo que vai permitir fazer despedimentos massivos ao nível da nossa escola pública e do nosso sistema educativo, sem que verdadeiramente toda a matriz curricular tenha sido pensada", vincou a deputada Ana Drago. 
Fonte: Educare